Que atire o primeiro bife quem nunca parou para pensar como seria a vida sem carne vermelha. Seríamos mais ou menos saudáveis? Tirando a discussão filosófica e ecológica e considerando somente o que tange a saúde, sobram argumentos pró e contra. A quantidade de informações contraditórias acaba confundindo e trazendo ainda mais dúvidas.

Embora a porcentagem de vegetarianos venha se mantendo estável ao longo da história, há um interesse crescente no assunto — basta olhar os restaurantes naturais e vegetarianos, que ficam lotados na hora do almoço. Há os mais radicais, como os veganos, que não comem nada de origem animal, outros que comem somente peixe, e aqueles que apenas aboliram os pedaços sangrentos da dieta.

Já os loucos por carne — categoria mais do que comum em solo gaúcho — também erguem suas bandeiras. Não gostar de picanha mal passada e de costela gorda é quase uma heresia. Para esta legião de carnívoros, pesquisas que apontam os malefícios do alimento são refugadas como brócolis em espeto corrido.

Para colaborar com ambos os lados, selecionamos algumas das pesquisas mais relevantes sobre o assunto. Cabe ao leitor tirar suas próprias conclusões. Afinal, esta é uma decisão pessoal e cabe a cada um fazer seu próprio julgamento.

Contra a carne

:: DNA — Um estudo da Open University britânica, publicado no jornal médico Cancer Research, comparou dietas repletas de carne vermelha com as vegetarianas. Segundo os cientistas, um cardápio rico dessa proteína teria maior possibilidade de causar câncer porque danificaria o DNA, provocando mutações e aumentando o risco de câncer.
:: Rins — Quem come muita carne vermelha pode ter maior risco de desenvolver alguns tipos de câncer renal, segundo um estudo feito nos EUA com milhares de adultos. Os autores do artigo publicado na revista American Journal of Clinical Nutrition concluíram que adultos de meia-idade que consumiam mais carne vermelha tinham 19% mais probabilidade de serem diagnosticados com câncer nos rins do que aqueles que faziam um consumo moderado.
:: Colesterol — O guia Abordagens Dietéticas para Prevenir a Hipertensão (DASH, sigla em inglês), indicado pela Associação Americana do Coração, é recomendado para a redução do colesterol e dos riscos de doenças cardíacas. A dieta encoraja o consumo de peixes e aves, mas não muita carne vermelha.
:: Diabetes — Comer um bife ou uma salsicha por dia aumenta o risco de desenvolver diabetes tipo 2. A conclusão é do maior estudo já feito sobre o assunto, com dados de cerca de 300 mil pessoas, acompanhadas desde a década de 1970. A pesquisa, feita pela Escola de Saúde Pública de Harvard, em Boston, foi publicada no American Journal of Clinical Nutrition. Já as carnes processadas, como salame e mortadela, foram consideradas mais prejudiciais: poderiam elevar o risco de diabetes em 51%.
:: Coração — O aumento do consumo de comidas ricas em proteína em substituição ao consumo diário de carne vermelha diminui no risco de desenvolvimento de doenças do coração. Os resultados, publicados no periódico Circulation, demonstraram que o consumo de carne vermelha — in natura ou processada — pode aumentar o risco do desenvolvimento dessas doenças cardíacas em até 30%.
:: Câncer — Um estudo sobre a relação entre o câncer e a carne vermelha publicado em 2007 na revista PLoS Medicine, afirmando que a dieta rica em carne vermelha pode aumentar em 24% o risco de câncer colorretal.
:: Intestino — "A carne dificulta a digestão, forçando o fígado e o estômago a produzir ácido em excesso", explica o oncologista suíço Fabio Levi, da Universidade de Lausanne. "E a corrosão das paredes do intestino pode provocar mutações cancerígenas", afirma.
:: Mutações — Outra substância presente na carne e apontada como perigosa é o amino heterocíclico. Apesar de não existir nas proteínas cruas, ele é criado pelo calor da grelha ou da panela, formando aquele "pretinho" crocante dos churrascos e das frituras. Os aminos acabam no interior das células, onde se ligam ao DNA e provocam mutações cancerígenas, conforme explica Barbara Pence, da Universidade Técnica do Texas (EUA).

A favor da carne

:: Obesidade — Gary Taubes, correspondente da revista americana Science e um dos principais escritores de ciência do mundo, escreveu um longo artigo no qual classificava o medo da gordura saturada como "dogma". Taubes afirma que, mesmo com tanta pesquisa, não há prova de que gordura saturada e infarto estão ligados. E vai além: diz que a propaganda do governo só serviu para fazer com que os americanos comessem mais — ao evitar a gordura, eles acabavam ingerindo mais carboidratos, mais açúcar, para manter a quantidade diária de calorias (o corpo tende a reclamar quando as calorias são insuficientes para saciá-lo — isso se chama fome). Resultado: o índice de obesidade passou de 14% para 22% no país. E obesidade, sabidamente, é um sério fator de risco para doenças cardíacas.
:: Coração — Os franceses e os mediterrâneos em geral consomem carnes de todos os tipos, mas têm ao seu favor o consumo de vegetais frescos e azeite de oliva, além de vinho. Seus índices de mortalidade por doenças cardíacas são bem mais baixos do que os norte-americanos. Além disto, eles vivem mais. Genética e conjunção de todos os fatores, como comer sem pressa, podem contribuir para isto.
:: Natureza — Não somos vegetarianos por natureza. O homem tem dentes pequenos e sistema digestivo curto, características de onívoros, como explica o antropologo físico Walter Neves, da Universidade de São Paulo, maior especialista brasileiro em homens pré-históricos. Ou seja, nosso organismo está preparado para comer de tudo, inclusive carne.
:: Proteína — A carne é um alimento do grupo construtor, que tem a maior concentração de ferro biodisponível (de fácil absorção pelo corpo humano), ou seja, com todos os aminoácidos essenciais à sua constituição, além do ferro heme que é, sem dúvida alguma, o mais eficiente no combate à anemia. Isso sem contar as demais qualidades: alto teor proteico de zinco, cálcio, fósforo, sódio, potássio, enxofre, cloro, magnésio, cobre, níquel, manganês e carboidratos (glicose e glicogênio), e ainda das vitaminas B1, B2, B3, B12, entre outras.
:: Vitaminas — As gorduras contidas na carne são fundamentais para a absorção das vitaminas lipossolúveis (dissolvidas em gordura) A, D, E, e K. O temido colesterol é o precursor da vitamina D (que fixa o cálcio aos ossos) e ainda dos hormônios adrenocorticais (estrógenos, andrógenos e progesterona). Elas são também precursoras das prostaglandinas, consideradas as substâncias biológicas mais potentes que existem no corpo humano, que têm a função de produzir relaxamento ou contração na musculatura, diminuem a pressão arterial e ativam (ou desativam) alguns hormônios.
:: Nutrição — Paulo Henkin, chefe do Serviço de Nutrologia do Hospital Ernesto Dornelles, afirma que quem não come carne "está na fronteira da boa nutrição e da desnutrição. Estudos de longa duração jamais encontraram uma relação contundente entre o aumento da longevidade e o não consumo de carne, pelo contrário". Henkin afirma que todas as dietas restritivas, não importa se de proteínas ou de carboidratos, levará o organismo a um déficit nutricional, potencializando várias doenças.
:: Ferro — A absorção do ferro das carnes é seis vezes maior do que o de vegetais. Isso porque nos vegetais a concorrência é desleal: o ferro convive com outras moléculas que atrapalham seu aproveitamento. Elas o deixam menos solúvel e mais difícil de atravessar a parede do intestino.
:: Colesterol — O consumo de carne vermelha magra pode ser saudável para o coração, da mesma maneira que a carne branca, segundo pesquisa publicada no American Journal of Clinical Nutrition, na qual é constatado que quando há o controle da gordura saturada, os índices de colesterol podem ser reduzidos.

Fonte: ZERO HORA – RS